Sob holofotes: O preço que Demi, Miley e Selena pagaram pela fama
- Gabrielli Vitória
- 2 de mai.
- 4 min de leitura
Atualizado: 7 de mai.

Nos anos 2000, o Disney Channel era mais do que um canal infantil: era uma fábrica de estrelas. Produzia não só programas de sucesso, mas moldava rostos, vozes e comportamentos que definiriam uma geração. Para milhões de jovens ao redor do mundo, nomes como Miley Cyrus, Selena Gomez e Demi Lovato simbolizavam talento, carisma e sonhos realizados. Mas o que havia por trás desse brilho encantado?
O tempo passou, e as três artistas, agora mulheres adultas, têm se posicionado publicamente sobre os impactos dessa fase de suas vidas. A realidade que emerge desses relatos é muito mais complexa do que o marketing infantojuvenil deixou transparecer. Depressão, transtornos alimentares, vícios, crises de identidade e colapsos emocionais são capítulos recorrentes nos relatos dessas ex-atrizes. A pergunta que fica é: valeu a pena?
Sim, a Disney foi um trampolim poderoso — elas ganharam visibilidade, contratos milionários e uma base de fãs internacional. Mas a que custo? Essas jovens foram lançadas prematuramente a uma indústria exigente, que pouco espaço dava para erros ou amadurecimento. Elas precisavam ser perfeitas, estar sempre sorrindo, cantar bem, atuar bem, se vestir bem e, acima de tudo, servir como "exemplo" — mesmo quando ainda estavam descobrindo quem eram.
Hoje, com mais liberdade para falar, vemos a construção de uma narrativa muito mais honesta e incômoda. E é justamente essa nova perspectiva que nos obriga a olhar criticamente para o modelo de produção de celebridades infantis: até que ponto o estrelato precoce é saudável? Quais são os reflexos disso no longo prazo? E por que continuamos normalizando essa lógica?
DEMI LOVATO
Demi Lovato talvez seja o exemplo mais explícito dos danos causados pelo estrelato precoce. Desde cedo, ela teve que lidar com a pressão de ser uma artista completa: cantora, atriz, modelo — e um "bom exemplo" para jovens. Aos 17 anos, no auge da fama com o filme Camp Rock, ela já enfrentava transtornos alimentares, autolesão e o início de um histórico com drogas. “Fui ensinada a não confiar em ninguém, nem em mim mesma”, revelou em seu documentário Child Star.
Ela descreve que o uso de substâncias começou como uma tentativa de preencher o vazio emocional e lidar com o medo constante de decepcionar. A overdose que quase a matou em 2018 escancarou uma ferida coletiva: a da indústria que finge não ver o sofrimento de seus astros — desde que o espetáculo continue. Demi sobreviveu, mas as cicatrizes continuam visíveis. Seu ativismo pela saúde mental hoje é uma tentativa de reconstrução, e também uma crítica ao sistema que a moldou e destruiu ao mesmo tempo.
SELENA GOMEZ
Selena Gomez sempre foi vista como a "boazinha da Disney", com uma imagem cuidadosamente polida e inabalável. Mas, por trás do sorriso constante e dos looks impecáveis, havia uma jovem que, segundo suas próprias palavras, “não sabia o que estava fazendo”. Em entrevistas recentes, Selena revelou o quanto se sentia perdida durante sua adolescência sob os holofotes — e como isso afetou sua saúde mental profundamente.
Ela foi diagnosticada com lúpus, passou por um transplante de rim e, em meio a tudo isso, enfrentou depressão, ansiedade e um transtorno bipolar. O documentário Minha Mente & Eu mostra um retrato íntimo e corajoso de suas lutas. Ao contrário da narrativa de superação que a Disney promove, Selena expõe o esgotamento emocional de alguém que foi tratada como um produto, e não como uma pessoa.
Ela fundou uma marca de cosméticos com foco em saúde mental, a Rare Beauty, e se tornou uma voz importante nesse debate — mas sua trajetória mostra como a indústria exige demais, cedo demais, de garotas que ainda nem entenderam quem são.
MILEY CYRUS
Miley Cyrus talvez tenha feito a transição mais radical e comentada entre as ex-estrelas da Disney. Intérprete da icônica Hannah Montana, personagem que vivia uma vida dupla — algo que, ironicamente, refletia a própria experiência da atriz —, Miley passou anos tentando desfazer a imagem que lhe foi imposta.
“Era muito para uma criança dar conta”, disse ela em entrevista. Aos 13 anos, já trabalhava horas exaustivas, era constantemente maquiada e monitorada, e precisava lidar com o conflito entre quem era e quem o público queria que ela fosse. Sua fase "rebelde", com clipes sexualizados e atitudes provocativas, foi duramente criticada, mas nada mais era do que uma tentativa de reconstrução identitária.
Hoje, Miley parece ter encontrado um equilíbrio, investindo em sua carreira musical de forma mais consciente. Mas a desconstrução de Hannah Montana foi dolorosa — e necessária para que ela pudesse, enfim, ser apenas Miley.
A QUE CUSTO VALE O SUCESSO?
O mais preocupante é que, mesmo depois de tantos relatos como esses, o ciclo continua. Crianças continuam sendo alçadas ao estrelato, cercadas por contratos, cobranças e expectativas irreais. Redes sociais intensificam essa vigilância. A cultura da fama, agora acelerada pelo TikTok e pelo Instagram, alimenta um sistema que consome juventudes como se fossem descartáveis.
Miley, Selena e Demi sobreviveram. Muitas não tiveram a mesma sorte. O que era sonho virou fardo, e só agora, com maturidade, espaço e tempo, essas artistas têm conseguido reescrever suas narrativas.
O sucesso é importante, mas não pode vir à custa da saúde emocional de crianças e adolescentes. Visibilidade não pode ser mais importante do que dignidade. E o entretenimento não pode continuar sacrificando vidas em nome da audiência.
Enquanto celebramos os talentos que surgem, precisamos também proteger os indivíduos por trás das telas. Para que o show continue — mas nunca mais às custas de quem ainda nem começou a viver.
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